03 agosto 2008

Hemocentro se prepara para pesquisar células de embriões

O Centro de Terapia Celular do Hemocentro do Hospital das Clínicas da USP, que faz transplantes com células-tronco adultas do cordão umbilical, da medula óssea, do tecido adiposo, se prepara para trabalhar com as células-tronco embrionárias. A informação é do professor Júlio César Voltarelli, coordenador da Unidade de Transplante, da Divisão de Imunologia Clínica e do Laboratório de Imunogenética do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto. Ele passou duas semanas no Reino Unido, percorrendo os centros mais avançados do mundo nessa área, junto com Mayana Zatz, pró-reitora de pesquisa da USP e coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano e Patrícia Pranki, pesquisadora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Outros três cientistas brasileiros eram para ter ido – inclusive o presidente do CNPq, Marco Antônio Zago, que também é do Hemocentro de Ribeirão - mas não puderam viajar em cima da hora. Os pesquisadores brasileiros começaram pelos centros de pesquisa do País de Gales, depois passaram pelos da Escócia e finalmente da Inglaterra.

A maioria dos centros visitados trabalha com células embrionárias, que já podem ser utilizadas no Brasil depois da autorização do STF, desde que tenham sido descartadas. O Brasil está atrasado nessa área 18 anos em relação aos pesquisadores do Reino Unido.

- O Hemocentro tem interesse em trabalhar com células-embrionárias e eu tenho interesse no futuro de trabalhar na parte clínica com essa terapia – disse Voltarelli, lembrando que tudo começará com a pesquisa básica. Para a implantação dessas pesquisas, é preciso ampliar as instalações, contratar e formar profissionais especializados com financiamento obtido através do CNPq – explicou o imunologista adiantando que já existem projetos sendo elaborados para linhas de pesquisa básica, sob a coordenação do diretor do Hemocentro, Dimas Tadeu Covas.

Começar do zero
Voltarelli que viajou a convite dos ingleses, ficou “satisfeito em contactar cientistas que fazem isso há muito tempo. Poderemos contar com a cooperação deles para implantar o projeto de pesquisa no Hemocentro”. A primeira coisa que os ingleses podem ensinar, segundo o cientista, é como produzir linhagens de células embrionárias.

- Nós estamos começando do zero e vamos tentar derivar linhagens dos embriões das clínicas de fertilização. Poderiam ser usadas no futuro para tratar doenças - acredita Voltarelli, que até hoje sempre trabalhou com células-adultas, por causa do seu interesse clínico.

A liberação do estudo com células embrionárias no Brasil é a oportunidade do país recuperar o tempo perdido.

- Um dos especialistas que visitamos na Escócia, trabalha num instituto que clonou a ovelha Dolly - conta o pesquisador que tirou uma foto no museu de Edimburgo, com a histórica ovelha embalsamada ao fundo. No Instituto onde a Dolly foi clonada, as pesquisas nessa área continuam. Mas a Universidade de Edimburgo criou um centro de terapia regenerativa com os mesmos propósitos do centro que está sendo implantado em Ribeirão Preto.

- A idéia é fazer linhagens de células-tronco para tratar várias doenças. Um desses pesquisadores, que é nascido em Portugal, se especializou em recuperar esses embriões que são congelados e não conseguem dar origem a um feto. Ele consegue fazer esses embriões inviáveis se multiplicarem e dar origem não a um feto - que não é o objetivo - mas a uma linhagem celular – explica Júlio Voltarelli.

O pesquisador acredita que essa experiência, num sistema de cooperação, será muito útil na hora de ensinar para os pesquisadores do Hemocentro “como transformar embriões inviáveis, que é o que está em nossa lei, em linhagens celulares que podem ser utilizadas em terapias de várias doenças.”

Projeto inclui transplante contra diabete com nova célula e contempla a esclerose múltipla
Enquanto aguarda a implantação de pesquisas com células-embrionárias no Hemocentro, Júlio Voltarelli dará continuidade a vários projetos de transplantes em andamento, com células adultas, para tratar doenças reumáticas, neurológicas e principalmente esclerose múltipla e diabete tipo 1 (que se manifesta antes dos 20 anos de idade).

O pesquisador quer usar no transplante contra diabete tipo 1, que fez pela primeira vez no mundo em 2004 - um tipo de células adultas ainda não utilizado: as mesenquimais. Essas células - consideradas precursoras da cartilagem, ossos, gordura, músculos e neurônios – são mais promissoras para o desenvolvimento de terapias que envolvem a resposta imune. O seu emprego em pacientes com a doença, depende de liberação de projeto pelo Governo.

Em quatro anos o cientista já usou o método de transplante de células-adultas contra a diabete tipo 1 em 22 pessoas. Desse total, seis pacientes voltaram a tomar insulina e estão sendo tratados com outras drogas para estimular o pâncreas a produzir o hormônio. O cientista não fala em cura, mas em resposta clínica positiva. Se essa resposta será ou não permanente, ainda não se sabe.

Transplante mais cedo
Voltarelli, coordenador do Centro de Transplante de Medula Óssea, esteve à frente também do primeiro transplante de células- tronco do Brasil para tratamento de lúpus, esclerose lateral amiotrófica e esclerose múltipla - esse último junto com o professor Amilton Barreira.

O cientista quer usar o transplante de células-tronco para tratar doentes com esclerose múltipla numa fase mais precoce.

- No final de agosto vamos aos Estados Unidos fazer um projeto de cooperação com um grupo de Chicago para tratar mais cedo esses pacientes - adiantou. Conta que tem usado esse transplante até agora em pacientes com a doença em estágio mais avançado, o que prejudica a recuperação.

- Até agora temos conseguido estabilizar o problema, mas se o transplante for feito precocemente, há mais possibilidade de provocar a regressão da doença - acredita.

Fonte: Jornal A Cidade

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