07 agosto 2008

Cientistas comentam versão 2.0 de célula adulta que ‘age’ como embrionária

Nova geração de célula iPS precisa da adição de só dois genes para ganhar versatilidade. Objetivo último é conseguir transformação sem usar vírus, viabilizando uso terapêutico.

Como lembrou bem Joseph Costello, em comentário na revista científica “Nature”, publicitários e até cientistas têm empregado, talvez inocentemente, um simples ‘i’ associado a diversas tecnologias inovadoras. Foi assim com iMac, iPhone, iPod, Wii, RNAi e, mais recentemente, com as células iPS, que chegaram para “revolucionar” as pesquisas com células-tronco.

No entanto, apesar da comparação, o ‘i’ que acompanha a sigla iPS significa mais do que uma simples etiqueta da nova geração. Ele provém do inglês induced pluripotent stem cell, que denomina células pluripotentes geradas a partir de células adultas, ou seja, já diferenciadas (especializadas).

Teoricamente, as células adultas, ou somáticas, originaram-se durante o desenvolvimento embrionário, derivadas de células pluripotentes, ou seja, células com potencial de se transformar em todos os tipos celulares do indivíduo adulto. Contudo, uma vez diferenciadas, essas células não adquirem mais a pluripotencialidade espontaneamente.

Resgate da versatilidade

A geração das células iPS garantiu, justamente, o resgate da pluripotencialidade das células adultas. Dessa maneira, foi possível criar células-tronco embrionárias, ou pluripotentes, a partir de células da pele de um paciente, por exemplo, com a mesma carga genética do doador das células, evitando possível rejeição em caso de transplantes.

Esse resgate foi garantido pela inserção de alguns genes – conhecidos pelas siglas Oct4, Sox2, c-Myc e Klf4, bem como Nanog e LIN28 – relacionados à pluripotencialidade, com a ajuda de vírus que serviam de vetores, carregando esses genes. As células reprogramadas eram muito semelhantes às células-tronco embrionárias, em todos os aspectos. Apesar da fantástica sacada, que acabaria com a discussão sobre a utilização de embriões para aquisição de células-tronco embrionárias, esse sistema ainda apresentava algumas falhas que precisavam ser sanadas para se começar a pensar na possibilidade de substituição do modelo atual de células pluripotentes “genuínas” pelas células iPS.

Uma dessas falhas seria a utilização de vetores virais para inserção dos genes, versões biológicas de cavalos-de-tróia capazes de incluir seqüências de DNA em locais indesejados do genoma, ocasionando o mau funcionamento da célula, por exemplo. Outro problema seria a utilização de genes como c-Myc, os quais, quando têm a sua expressão (ativação) descontrolada, podem originar células tumorais.

Minimizando as falhas

Tentando minimizar essas falhas, uma equipe alemã liderada pelo pesquisador Hans Schöler acaba de publicar um trabalho na revista “Nature”, relatando a geração de iPS a partir de células precursoras de neurônios, com a utilização de apenas dois genes indutórios.

Com a inserção de quatro genes – Oct4, Sox2, c-Myc e Klf4 – a equipe obteve sucesso na reprogramação, reproduzindo os resultados das primeiras iPS, induzidas a partir de células de pele, pelas equipes dos pesquisadores Shinya Yamanaka e Rudolf Jaenisch.

Posteriormente, Schöler arriscou a retirada de cada um desses genes e observou que as iPS só apareciam quando o gene Oct4 estava incluído na combinação de três genes. De forma mais ousada, a equipe alemã apostou na utilização de apenas dois genes e obteve sucesso nas combinações tanto de Oct4 e Klf4 (mais eficiente), como de Oct4 e c-Myc. Isso foi possível pois, como verificado anteriormente pelo grupo, as células neurais de camundongo expressam naturalmente altos níveis de Sox2 e c-Myc, sendo admissível a remoção desses genes para a indução das iPS usando essas células como fonte.

Baseado nesses dados, Schöler propõe que o mais indicado para a geração de iPS sejam células somáticas que expressem altos níveis de alguns desses indutores, como é o caso dos progenitores neurais utilizados, reduzindo a necessidade de utilização de quatro vetores virais. Além do mais, sugere que seja investigada a utilização de substâncias químicas capazes de controlar a expressão de genes associados à pluripotencialidade, como Oct4 e Klf4, evitando-se assim o uso do vetor viral. Dessa maneira, não só os riscos associados à utilização de vetores virais seriam minimizados como também a utilização exógena de fatores de risco como o c-Myc. Bem-vinda seja a versão 2.0 das iPS!

Bruna Paulsen e Stevens Rehen são pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

Fonte: G1

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